quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Curas

A Fal escreveu uma engraçadíssima crônica sobre os ataques manifestos de melancolia.
Sem qualquer possibilidade de expressar meu humor numa escrita tão vigorosa e bonita como a dela não pude deixar de considerar os ataques de melancolia que eu vivi em épocas anteriores.


Penso que esses ataques não eram tão claramente expressos. Na verdade, eram insidiosos.

Quando eu tinha feito qualquer coisa que mereceria um puxão de orelha ou quando pintava uma
angústia daquelas inexplicáveis ou quando eu tinha sofrido uma decepção; qualquer coisa assim,
que a gente costuma chamar de tristeza,
no café da manhã, lá estava meu avô, que parece que adivinhava
o mau estado de ânimo que eu carregava
e compenetrado serrava uma grossa fatia de pão,
que a seguir dividia em tiras também grossas
então empurrando o seu prato na minha direção
dizia com seu timbre nasalado no
sotaque carcamano:
"Pocha Bela, pocha."

Eu obedecia imediatamente, encharcando o pão no café com leite
e me inclinando rapidamente para morder sobre a tigelinha
 – ainda tomávamos o café com leite em tigelas, feito os franceses.

Café adoçado com açúcar e leite integral e as tiras eram cortes do filão de pão de banha.

Ao fim da refeição, meu avô agradecia: "Graças a Deus hoje também comemos"

Talvez pelo o fato de perceber meu avô
atento às minhas prosaicas mazelas,
ou por ter aquele ritual serenamente cumprido
ou talvez, devesse à comida de verdade
sem diet ou light depois do nome de batismo,
 a verdade é que minha tristeza ficava encolhidinha,
no fundo da minha alma e quando a tristeza ia embora
eu já nem me lembrava do porque de ela haver se instalado.





Então inté...